Mana do Mês de maio – Azucena Villaflor
Você já deve ter ouvido falar da importância de um coletivo de mães contra o autoritarismo da Ditadura Civil-Militar da Argentina (1976-1983). A associação Madres de Plaza de Mayo reunia mulheres que denunciavam e cobravam informações de seus filhos sequestrados e entes queridos desaparecidos nesse período. E uma dessas mães teve papel crucial para a organização do coletivo, que foi a Azucena Villaflor (1924 – 1977).
Por esse motivo, no mês que se comemora o Dia das Mães no Brasil e se recorda a luta feminina durante a última ditadura que houve na Argentina, a categoria Mana do Mês homenageia a trajetória de “la madre de las madres”.
Quem foi Azucena Villaflor?
De uma família operária, Azucena Villaflor de Vicenti nasceu em Avellaneda, na província de Buenos Aires, no dia 7 de abril de 1924. Filha da dona de casa Emma Nitz, que a teve com apenas 15 anos, e do operário de uma fábrica de lã, Florentino Villaflor, era uma “pessoa comum”, mas que tinha como características a predisposição de liderança e amor pelos filhos.
Azucena começou a trabalhar cedo. Foi contratada aos 15 anos como telefonista em uma fábrica de geladeiras e viveu o importante 17 de outubro de 1945, considerado um marco na luta sindical argentina, pois milhares de trabalhadores interromperam seus serviços para pedir a libertação de Juan Domingo Perón. Ela se casou em 1949 com o também operário Pedro de Vicentini e juntos tiveram quatro filhos: Pedro, Néstor, Adrián e Cecilia.
Assim como muito jovens universitários nos anos 70, o seu segundo filho, Néstor, começou a militar na Juventud Peronista, quando estudava na Facultad de Arquitectura. O que eles não sabiam é que esse engajamento político mudaria a vida de ambos, mãe e filho.
Como surgiu o coletivo Madres de Plaza de Mayo?
Em 30 de novembro de 1976, Néstor e sua namorada, Raquel, foram sequestrados pelos generais da Ditadura, que havia se autodeclarado como "Processo de Reorganização Nacional". Azucena não ficou com os braços cruzados e passou a cobrar explicações do paradeiro de seu filho e sua nora.
Cansada de não obter respostas dos funcionários da Ditadura, ela convocou outras mulheres a se reunirem na Plaza de Mayo, símbolo histórico de luta em Buenos Aires e sede do governo, a Casa Rosada. Seis meses após o sequestro, no dia 30 de abril de 1977, às 16h30, elas se encontraram e desafiaram a ditadura que proibia reuniões de mais de 3 pessoas em via pública e cobraram respostas sobre o paradeiro de seus entes queridos.
Por esse motivo, a data 30 de abril de 1977 é tão simbólica porque marca o início físico do enfrentamento matriarcal de 14 mulheres contra o governo autoritário, que as batizou de “loucas”. Azucena assumiu o necessário papel de liderança ao fundar e ser a primeira presidenta do coletivo.
Com o tempo, outros e outras militantes dos direitos humanos se juntaram ao grupo de mães. As reuniões passaram a ser feitas em Igrejas, paróquias e bares para fugir da forte repressão militar que aumentava com o avanço das manifestações na Plaza de Mayo. Inclusive, faziam falsas festas de aniversário, nas quais compartilhavam dados e documentos dentro das embalagens de falsos presentes.
O sequestro e desaparecimento de Azucena
As Madres de Plaza de Mayo incomodavam os generais que introduziram um espião dentro do coletivo. O militar Alfredo Astiz as enganou ao dizer que também tinha um familiar desaparecido, mas, na verdade, estava ali para vazar informações importantes e destruir a organização. Ele se aproximou de Azucena pela primeira vez durante uma missa em comemoração aos Dias das Mães, que acontece em outubro no país.
Após saber da intenção de se publicar um dossiê com o nome dos desaparecidos no jornal La Nación, os militares sequestraram oito pessoas no dia 8 de dezembro, na saída de uma missa pelo Dia de la Virgen. Por sorte, Azucena não estava no grupo sequestrado.
Ela não salvaria a sua vida novamente. 48 horas depois, no dia 10 de dezembro, Azucena foi sequestrada perto da sua casa. Segundo testemunhas, ela se jogou no chão e gritou, mas não resistiu às agressões e foi levada em um carro pelos militares. Em seguida, foi sequestrada e morta, não podendo regressar mais.
Contar a história de Azucena é contar a história de uma mulher comum que desafiou a ditadura argentina e pagou com a própria vida. Mais de 40 anos separam a sua morte dos tempos atuais, mas seu legado permanece vivo como exemplo de luta contra o autoritarismo e a repressão na América Latina, que será tema da segunda parte* desse texto.
* A continuação desse texto estará disponível no próximo dia 23 de maio, encerrando as homenagens a Azucena Villaflor.
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'Mana do mês' é a personalidade feminina influente escolhida para ser homenageada pelo Telas. Todo mês uma mulher importante e relevante é selecionada para contarmos sua história e legado
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