A pandemia e os shows ao vivo: como estão os artistas da noite carioca?
O setor de bares e restaurantes foi um dos mais afetados pela pandemia do novo coronavírus. Durante meses, os estabelecimentos permaneceram fechados e a noite carioca, que é tão agitada, teve de dar espaço ao necessário isolamento social recomendado pelas autoridades sanitárias, impactando na vida de milhares de trabalhadores.
O cenário mudou um pouco nas últimas semanas. As cidades da região metropolitana do Rio de Janeiro, visando o restabelecimento da economia, permitiram a reabertura de bares, mas sem um atrativo tradicional da boemia carioca: a música ao vivo. Isso ainda é agravado por dados que indicam o fechamento de cerca de 30% dos estabelecimentos, somente na cidade do Rio de Janeiro, até o final do ano.
Todo esse painel de incerteza gera um impacto financeiro negativo na vida de muitos cantores, músicos e artistas que vivem das apresentações nesses espaços, em casas de shows e festas particulares, assim como demais profissionais da cadeia produtiva da música ao vivo.
Esses profissionais, que embalam a noite carioca e fluminense e fazem parte do repertório cultural da região, precisaram se reinventar e estão fazendo isso. É possível observar a migração dos encontros presenciais para o universo virtual, evidenciando um novo movimento de união e possivelmente mais forte entre os profissionais e o público (mesmo que distantes fisicamente).
Mas algumas questões ficam em aberto sobre como trabalhar no ambiente digital, as perspectivas dos próximos meses e se existe um retorno seguro no momento.
A união faz a força
Essa frase é clichê, mas vem fazendo sentindo nos últimos meses. Para a cantora carioca Elis Loassy, a pandemia mostrou a necessidade de se rever conceitos. Ela sente que há maior cuidado com o próximo e sentimento de comunhão entre os músicos. Um exemplo disso foi a campanha #ApoieUmMusico, na qual ela fez parte. Desse projeto, saiu uma música nova, um calendário de lives e arrecadação virtual.
Desenvolvida pelo Quiosque Coisa de Carioca, situado no posto 4 da orla de Copacabana, a campanha criou uma contribuição virtual com renda 100% revertida para os 13 músicos e bandas que se apresentam no espaço. “A ideia foi que a hashtag alcançasse outros músicos e quiosques. Fizemos música, fizemos shows virtuais e foi bacana”, disse Elis.
Já na região metropolitana do Rio, foi criada a campanha SOS São Gonçalo, responsável por reunir 30 artistas residentes na cidade, dentre elas a cantora Vanuza Alves. Além disso, ela utilizou o tempo para fazer o que sabe de melhor, mais música. Junto a Biafra Santos, criou o duo Ponto 2 e passou a divulgar o trabalho nas redes.
“O trabalho presencial está estagnado. Então, eu pensei que seria melhor unir forças e fazer com que esse isolamento trabalhasse a nosso favor. Você pode estar isolado ,e ainda assim, perto de quem você ama. Convidei parceiros para que trabalhássemos nesse isolamento e levar felicidade às pessoas através da música”, revelou Vanuza.
Reivenção e o formato das lives
Sem os palcos físicos, a solução foi fazer apresentações virtuais. Desde o início do período de isolamento social, vimos o boom do formato das lives. Essa migração natural para o digital foi a maneira que muitos artistas encontraram de manter o contato com o público e fãs que os acompanhavam nas apresentações pelos bares da cidade.
Elis, que fazia cerca de 25 shows por mês pela cidade, foi uma das que investiu nas lives. Ela afirma que esse é um formato viável artística e economicamente também, mas que precisa de muito planejamento e estudo.
No próximo domingo (9), ela vai realizar a sua terceira apresentação virtual, sendo a primeira com patrocínio e realizada pela sua agência de marketing, a Do It, criada com a produtora Caroline Farias, sua parceira de vida e de negócios. Elas prometem muito alto astral e música boa para melhorar nosso domingo.
“A gente vem estudando para fazer um trabalho bacana porque isso é algo novo. É uma loucura, mas está sendo bem divertido. Fizemos um plano de marketing, apresentamos aos patrocinadores e eles gostaram bastante. Hoje, ainda tem muita gente ajudando na divulgação, de famosos a anônimos. A gente viu que esse formato funciona", disse Elis.
Apesar de problemas técnicos com a conexão, ela garante que as primeiras lives foram um sucesso, pois aproximou a artista de novos fãs. Agora, com reforço técnico e banda reduzida devido às recomendações de distanciamento social, ela espera mais um retorno positivo do público, que poderá pedir música a partir de um QR Code na tela.
Ela pretende seguir com o planejamento para realizar mais lives “e seguir trabalhando em segurança”. É uma maneira de amenizar o impacto da perda financeira da agenda lotada que a cantora tinha antes da pandemia. Atualmente, conta com o apoio financeiro de familiares e o auxílio emergencial, além de trabalhos remotos no formato freelancer.
As lives funcionam como divulgadoras e ampliam a música dos artistas a novos públicos também já que não tem barreiras geográficas. Além disso, leva entretenimento aos milhões de pessoas em isolamento social. Também serve para arrecadar fundos ainda que os cachês sejam pequenos em comparação aos artistas que estão no mainstream, como afirmou o violonista Edney Mesquita e a cantora Aline Ribeiro, que se apresentam juntos pelo Grande Rio.
Hora de voltar aos palcos
Enquanto as vacinas estão sendo desenvolvidas, muito se fala de “um novo normal” que não abrange atividades culturais como shows ao vivo com presença de público. Tal cenário reforça a pergunta: qual é o momento certo para o retorno aos palcos? Edney e Aline, por exemplo, não têm perspectivas de retornar aos bares e restaurantes neste ano.
Edney, inclusive, é contra espaços em cidades, como São Gonçalo e Cabo Frio, que já retornaram os shows ao vivo presencialmente. “Discordo totalmente dessa postura, pois os números só crescem, mas entendo perfeitamente a situação dos colegas músicos”, disse.
A partir deste mês, os dois planejam aceitar convites para festas privadas e eventos corporativos, tendo em vista os protocolos sanitários, como o uso de máscara, a utilização de álcool em gel, público reduzido e pouco contato físico.
Aline, que chegou a solicitar o auxílio emergencial, teve de recorrer a outras atividades para completar a renda da live “Todo Samba”, que é realizada no Instagram e está em busca de patrocinadores.
“Os trabalhos musicais neste período estão sendo muito dificultosos. Cheguei a solicitar o auxílio emergencial, e atualmente estou vendendo empadas e bolos de pote, para obter algum recurso. Aliás, muitos colegas partiram para a área de alimentação, lanches, delivery, etc”, disse Aline.
Elis também se preocupa com a saúde dos profissionais e do público caso maiores aglomerações retornem. “Confesso que tenho receio quanto a voltar ao trabalho em um momento que não tem vacina”, contou. Pelo atual decreto da Prefeitura do Rio, shows ao vivo só devem ocorrer em 2021, mas essa medida pode ser antecipada. Ainda assim, Elis só pretende voltar com shows corporativos neste ano, pois são mais fáceis de se controlar, além de seguir com as lives.
Já Vanuza, que faz 15 shows mensais e divide o seu tempo com um escritório de contabilidade, se mantém esperançosa. “Eu quero que aconteça um milagre. Nem espero nada para agosto, sabe? Mas pelo menos para setembro”, revelou em relação a shows corporativos, de onde vem a maior parte de sua renda musical.
____
O Telas Por Elas faz coro ao isolamento e distanciamento social quando possível. O site segue atento ao calendário de lives enquanto as nossas aglomerações favoritas não estão recomendadas pelos órgãos de saúde. Por isso, compartilhamos em nossas redes sociais as que mais se destacam, como as das nossas entrevistadas que farão apresentações virtuais neste mês de agosto. Confira a seguir:
#FelizEmCasa, com a cantora Elis Loassy
09 de agosto (domingo), às 14 horas, no YouTube
Todo Samba, com Aline Ribeiro e Edney Mesquita
23 de agosto (domingo), às 16 horas, no Instagram
Ponto 2, com Vanuza Alves e Biafra Santos
29 de agosto (sábado), às 17 horas, no Facebook
Comments